quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Sobre olhos e armadilhas


Autora: Ana Patrícia Monção Figueredo

É que acabou, né? Vai, diz pra mim que acabou só pra eu confirmar, só pra eu me convencer de que acabou e acabou mesmo. É que nos últimos dias eu tenho repetido pra mim que já era, entre um gole de café e outro, eu tenho repetido entre uma lembrança e outra que já deu e que eu preciso te esquecer.
Nem vale esse sofrimento todo, certo? Vai passar, vai passar. Tô aqui tentando me convencer de que esse seu sorriso nem é tão lindo assim e que esse par de olhões eu posso encontrar em qualquer esquina, mas eu já andei em tanta esquina e nada de olhões em forma de armadilha me pegarem.
A noite é mais triste sem você, a mesa do bar fica incompleta sem sua cerveja nela, e minha mão fica incompleta sem a sua pra segurar por cima da mesa. É que não dá pra rir numa roda de amigos sem ouvir a sua risada, fica feio como um coral desafinado. É que não dá pra rir sem ver suas covinhas, o defeito genético mais lindo do mundo. Mas eu rio, fingindo que tá tudo bem e engraçado, enquanto por dentro eu choro, achando tudo sem graça e cinza.
Eu queria poder te matar dentro de mim, mas pra te matar eu tenho que matar as diversas versões que você criou de mim. Eu tenho que matar meu riso preguiçoso e sossegado ao ver a luz do sol bater na cortina do teu quarto depois de ter passado a noite toda em teus braços. Eu tenho que matar minha voz de menina mimada perguntando entre um beijo e outro “por que você não fica comigo? ”. Eu tenho que matar a minha ingenuidade em acreditar que esse amor era só meu e era o mais bonito de todo o universo. Tenho que matar meus arrepios quando você beijava meu pescoço. Matar minha safadeza de chupar seus dedos em lugares movimentados e depois te intimar a me levar pra um lugar mais calmo e continuar o que eu comecei.
As versões que eu criei pra te amar melhor, pra te amar gostoso, pra te amar demais. É que eu não sei gostar pouco, e gostar muito de ti foi tão bom, até que não foi o suficiente porque tu não gostava de mim do mesmo jeito, e eu tive que calar minhas preces de “fica mais um pouco” querendo dizer “fica pra sempre”, e mandei você ir.  E agora acabou, né? Vai, diz pra mim que acabou só pra eu confirmar, só pra eu me convencer de que acabou e acabou mesmo.

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